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Guerra síria faz estilista virar camelô e engenheiro vender roupas em SP

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Conheça histórias de refugiados; maioria trabalha em lojas do Brás. Aula de português em mesquita ajuda na adaptação à nova vida.eq3a0917-2

Na sala de aula improvisada na Mesquita do Pari, um grupo de cerca de 20 pessoas recita junto com a professora o alfabeto e os números em português. O sotaque árabe é forte, mas a vontade de aprender também é grande: eles sabem que precisam se tornar fluentes no idioma para conseguir se adaptar à nova vida que estão construindo em São Paulo.

A turma é heterogênea: há jovens, idosos, um casal com crianças, engenheiros, professores, eletricistas, pessoas de todas as profissões e classes sociais. A maioria chegou ao Brasil sem conhecer ninguém. Também não tinham lugar para morar, fonte de renda ou conhecimento da cultura do país. Cruzaram o oceano rumo ao desconhecido na esperança de um recomeço após perderem casa, emprego e segurança na Síria, atingida por uma guerra civil que acaba de completar três anos.

Uma vez aqui, foram acolhidos por conterrâneos que conheceram pela internet e por comunidades religiosas como a da mesquita onde as aulas de português acontecem. Eles tentam ajudá-los como podem, auxiliando com a burocracia, com moradias provisórias, empregos informais, tratamento de saúde.

Mas as barreiras são muitas. Como eles chegam com visto de turismo (o pedido de refúgio tem que ser feito em território brasileiro), não podem tirar carteira de trabalho. Pior: podem ter que esperar sete, oito meses pela entrevista para obter o protocolo que serve como documento enquanto o registro definitivo não sai. Nesse período, o visto de turista vence, e eles acabam ficando ilegalmente no país até a situação ser regularizada.

Para conseguir se sustentar, muitos trabalham em lojas de roupas ou em feiras na região do Brás, independentemente da profissão que tinham antes de chegar aqui. Alguns ficam em hotéis por um período, outros dividem apartamentos com mais refugiados ou se hospedam em mesquitas, igrejas e abrigos.

E assim vão levando, tentando melhorar de vida e se adaptar a uma cultura que é muito diferente da sua. Há quem não aguente e procure outro país com oportunidades melhores ou até volte para a Síria. Foi o caso, por exemplo, de um casal que, sem saber onde procurar ajuda, foi morar na rua no centro de São Paulo e acabou sendo vítima de violência – a mulher foi estuprada no episódio. Traumatizados, eles preferiram voltar para o cenário de guerra.

Mas a maioria pretende ficar aqui ao menos até a situação melhorar em seu país. Para eles, as deficiências na assistência oficial acabam sendo compensadas pelo jeito acolhedor dos brasileiros. Conheça a seguir a história de alguns desses refugiados que vivem na maior cidade do país.

O casal Abdallah e Nisreen Mohammed chegou a São Paulo há apenas cinco meses, mas já tem um filho brasileiro. Nisreen, de 25 anos, estava no fim da gravidez quando embarcou no voo para o Brasil junto com o marido e uma filha de dois anos.

O plano inicial era ir para a Europa. Abdallah conta que pagou quase US$ 20 mil para um intermediário fazer um visto e enviá-los para “qualquer país da União Europeia que os aceitasse”. Segundo ele, o homem os enganou e eles só se deram conta de que teriam que desembarcar no Aeroporto de Guarulhos quando já estavam aqui. “Pensamos que faríamos uma conexão no Brasil e depois iríamos pra Europa”, diz o eletricista de 30 anos de idade.

O sírio diz que ficou “chocado” quando percebeu o que havia acontecido. “Chegamos aqui e é uma cultura diferente, um idioma diferente, não conhecíamos ninguém, não tínhamos dinheiro para sobreviver”, diz.

Com a ajuda dos voluntários da mesquita, Nisreen conseguiu fazer o pré-natal, ter o bebê na Santa Casa de Misericórdia e registrar a criança.

Mas a adaptação da família não está sendo fácil. Sem falar português ainda – não dá tempo de estudar, diz Abdallah –, ele conseguiu um emprego em um restaurante árabe no Brás. Junto com a mulher e os filhos, acaba de se mudar para um apartamento de dois quartos no centro, compartilhado com outra família de refugiados com quem não tinham tido nenhum contato antes de chegar aqui.

No ambiente quase sem móveis, há apenas uma cama de casal para o casal dormir com as duas crianças. “A vida em São Paulo é muito difícil. Não temos ajuda do governo, os aluguéis são muito caros comparados com o salário que a gente recebe. A vida é casa-trabalho-trabalho-casa”, diz.

Abdallah afirma que sente saudade de “tudo” na Síria, mas sabe que não dá para voltar para lá por enquanto. Com os bombardeios em Aleppo, cidade onde morava, ele perdeu casa, amigos e parentes. “Quando acabar a guerra, se tivermos como viver lá, queremos voltar. Mas antes precisamos de um lugar para construir nossa vida , abrir o nosso caminho”, diz. (G1)

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