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Políticos tentam surfar nas ondas de Isaquias Queiroz

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Governador da Bahia e prefeito de Ubaitaba tentam justificar a falta de investimentos e prometem centro de treinamento.

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Nova geração. Jovens de Ubaitaba, cidade onde Isaquias Queiroz nasceu e foi criado no sul da Bahia, dão as suas primeiras remadas no Rio de Contas – Daniel Marenco

A carreata que acompanhou o desfile de Isaquias Queiroz no caminhão dos bombeiros na noite da última sexta-feira não foi a única que movimentou Ubaitaba no fim de semana. A disputa eleitoral para prefeito esquenta a pequena cidade do Sul da Bahia e divide, com o trimedalhista olímpico, os comentários na Praça Cultural, nos bares próximos à rodoviária, no comércio da Avenida Vasco Neto e na feira à beira do Rio de Contas. Na verdade, são assuntos indissociáveis, ao menos na última semana.

Ao pôr Ubaitaba no mapa esportivo brasileiro e sob os holofotes da imprensa nacional, Isaquias fez disparar nova corrida entre as forças políticas atuantes na cidade, onde prefeitura e governo estadual são adversários: ver quem é mais rápido em justificar ou disfarçar a falta de investimentos até hoje e em prometer apoio à Associação Cacaueira de Canoagem (ACC), o celeiro de velocistas de Ubaitaba que ocupa apenas uma casa, sem água e sem luz, à beira do rio.

O governador Rui Costa, do PT, fez o primeiro movimento, tentando surfar na onda de sucesso da Olimpíada. Já na semana passada, afirmou que entrou em contato com o governo federal e que, na hipótese de Brasília não liberar dinheiro, seu governo pagará a construção de um Centro de Treinamento (CT) de canoagem e da instalação de uma raia olímpica no Rio das Contas, que são as grandes necessidades da ACC, num investimento calculado em R$ 8 milhões .O governador da Bahia também já havia prometido a construção de um CT de boxe e lutas olímpicas, este em Salvador, durante solenidade com o campeão olímpico de boxe Robson Conceição, outro medalhista baiano dos Jogos Rio-2016.

No próximo sábado, o governador deve aparecer em Ubaitaba para a festa, com direito a shows de arrocha, que está sendo preparada para Isaquias. Se for, será recebido por um desafeto. O líder político de Ubaitaba é Asclepíades de Almeida Queiroz (não é parente de Isaquias), o Bêda, do PMDB, atualmente no fim de seu terceiro mandato como prefeito. Apadrinhado politicamente pelo atual ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, Bêda ganhou interlocução em Brasília com a ascensão do grupo de Michel Temer ao poder central, e mostra descrédito pelas promessas do governador Rui Costa.

— Ora, pedir (ao governo federal) todo mundo pede, isso eu também fiz. Geddel me levou a Brasília, estive com o ministro do esporte. Agora ele diz que vai fazer (o CT), mas o governo estadual nunca investiu aqui. Se o governo federal liberar o dinheiro, não quer dizer que foi o governador — disse o prefeito.

Bêda enfrenta dificuldades em seu terceiro mandato. No ano passado, ele teve suas contas relativas a 2014 rejeitadas na primeira análise pela Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) da Bahia, por desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal. Outras denúncias aumentaram seu desgaste junto à população, a ponto de ele ter desistido de tentar nova reeleição. Há alguns meses, pediu licença médica da prefeitura, abrindo espaço para que seu vice, Paulo Bidu (PP), assumisse o cargo e ganhasse notoriedade na cidade. Bidu é o candidato da situação, e concorre à prefeitura contra Suka (PSB), vereadora líder da oposição na câmara local e apoiada pelo governador Rui Costa.

A licença médica não impediu que Bêda, acompanhado da mulher e da filha, fosse ao Rio ver Isaquias competir, junto da mãe do canoísta, dona Dilma. Com camisas homenageando o atleta, Bêda e família também receberam Isaquias no aeroporto de Ilhéus, na última sexta-feira (26). O prefeito licenciado nega qualquer tentativa de extrair benefícios eleitorais da proximidade com o atleta, que, em seu discurso na praça Cultural na noite da última sexta, garantiu que ficará afastado da eleição.

— Não acredito que ele vá dar apoio. Eu poderia até dizer que ele é meu eleitor, ele mesmo já disse que é Bêda, mas está sendo aconselhado a não se expor, não participar de nada. Conhecemos a família há muito tempo — diz Bêda, garantindo que seu afastamento da prefeitura não se deu pelo desgaste de sua imagem. — Não sou candidato mas não vou deixar de fazer política. Decidi não concorrer mais porque está difícil você fazer pela cidade. O cacau foi prejudicado pela vassoura de bruxa, os recursos de IPTU são irrisórios, o que entra de ISS mal dá para pagar a folha. Com muito esforço mantive a folha em dia. Não sobra um real para investimentos.

Com cerca de 1.500 funcionários, a prefeitura é uma das principais motrizes da economia de Ubaitaba, empregando mais de 20% da população economicamente ativa. O cacau e o comércio urbano, ao redor do qual orbitam cidades vizinhas como Aurelino Leal e Ubatã, completam as principais receitas.

DESCRÉDITO COM A POPULAÇÃO

A falta de mínima infraestrutura, como saneamento básico, se vê nos bairros mais pobres, como o Armandão, um conjunto de barracos e casas de tijolos à beira da BR-101, onde dona Dilma, ali apelidada de Ina, criou seus filhos, entre eles Isaquias. O canoísta viveu ali até os sete anos, numa casa de tábua que já não existe mais, uma das ruas de barro.

— Era uma criança como as outras, ficava o dia pelas ruas, brincando de fazer boneco de barro quando chovia. O Armandão sempre precisou de investimentos, até hoje continua assim — diz Lázaro Martins, de 31 anos, cantor gospel e dono de uma mercearia vizinha ao local onde Isaquias foi criado. — É um orgulho para a gente, né? Eu mesmo comecei este ano a praticar canoagem.

Ausentes nos bairros mais carentes e também no incentivo à canoagem, que deveria ser o carro-chefe de Ubaitaba, prefeitura e governo estadual empatam nos minguados incentivos que a ACC recebe. Costumeiramente campeão nacional de clubes, a delegação da ACC costumam viajar para o Brasileiro da modalidade (o próximo é em setembro, em Curitiba), num ônibus cedido pela secretaria estadual de esporte e com uma verba de alimentação e hospedagem dada pela prefeitura. Quem ajudou a formar Isaquias e sofre com a falta de estrutura na sede da associação não consegue dar crédito às promessas, mesmo após as medalhas.

— Olha, dizer que vão fazer o CT, dizem há muito tempo. É difícil você acreditar. Ano passado Isaquias foi campeão mundial, falaram a mesma coisa e nada — diz Luciana Costa, uma das duas professoras da ACC. (O Globo)

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