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Seca em Caetité obriga população a contar os dias para receber água
Sabe aquela brincadeira de que banho é só domingo? Em Caetité ela não é tão brincadeira assim. E não é por falta de higiene da população. É falta de água mesmo. Os quase 50 mil habitantes do município do Centro-Sul baiano vivem há dois anos recebendo água em suas casas durante quatro dias.
Nos outro quatros dias é a vez da outra metade da cidade receber sua cota. Desde 2012, quando os mananciais que abasteciam a cidade secaram, a população conta os dias que a água vai “cair”. O calendário é elaborado pela Embasa e distribuído à população a cada três meses. São quatro dias com previsão de água e outros quatro com a torneira seca. E, mesmo nos dias determinados, é possível que a água não venha. O próprio calendário da Embasa já avisa que “a sua casa poderá ser abastecida entre o 1º e 4º dia” previsto.
Apesar de estar localizado no semiárido baiano, uma região muito seca, a cidade nunca passou por nada semelhante, segundo os moradores. “Para não ficar sem água, enchemos baldes e também dividimos as tarefas em casa. Algumas, pra quando tem água na rede, e outras, que não dão pra esperar, fazemos com o que temos”, diz a professora Cristiane Souza.
E hoje a situação é até melhor do que há três anos, logo quando começou o racionamento. No ano passado, Cristiane viu a sogra, que morava no bairro Observatório, que fica no Setor A, passar uma semana sem comer, porque não tinha como cozinhar.
“Teve um período que eles não liberaram água e ela ficou uma semana sem comer. A água que tinha só dava para tomar um meio banho. Cozinhar, nem pensar”, conta a professora. A solução foi mudar para o Setor B da cidade, que também passa pelo racionamento, mas onde há menos problemas, segundo a professora.
A divisão em setores foi estabelecida pela Embasa para organizar a distribuição de água no município. Assim, cada área tem dias diferentes em que a água chega.
Mananciais
O racionamento em Caetité começou em abril de 2012, quando os mananciais Moita dos Porcos, Passagem das Pedras e Santarém secaram completamente, durante uma seca severa que atingiu a região. Outros municípios próximos também entraram em racionamento, mas apenas em Caetité o problema permanece até hoje. Isso porque as obras realizadas pela Embasa já conseguiram levar água até eles.
“Mesmo no período chuvoso, no fim do ano passado, o racionamento permaneceu. Essa é uma das piores situações em Caetité, nunca vivi nada semelhante”, conta o empresário Marcos Oliveira.
Sem água regular, os pequenos criadores acabam tendo prejuízo. “Tem gente que pensa que o racionamento é apenas na sede, mas é em todo município. Na área rural, muitos produtores já chegaram a vender as criações por preço bem abaixo do mercado, para não perder tudo”, relata Oliveira.
O próprio prefeito da cidade, José Barreira (PSB), lembra um dos piores momentos da seca, em que as aulas tiveram que ser suspensas em algumas creches. “Já aconteceu de ter que fechar creche, escola, um dia ou outro, porque não tinha água para manter a escola aberta”, conta.
Adutora
A esperança dos moradores de Caetité está na conclusão da segunda etapa da obra da Adutora do Algodão, que levará água do Rio São Francisco até o município. Segundo o presidente da Embasa, Abelardo Oliveira, a obra deve ser entregue em junho deste ano.
“Até junho, a população vai receber a água do São Francisco, que vai resolver a situação pelo menos para os próximos 20 anos”, garante o presidente. A obra, segundo a empresa, está com 83,9% da sua estrutura prevista montada.
Mesmo assim, os moradores de Caetité andam sem esperança de ver a situação resolvida ainda este ano, já que a obra deveria ter sido entregue no ano passado. “Eu não vejo perspectiva de mudança, mas tomara que eu esteja errada”, afirma Cristiane Souza.
Para o prefeito José Barreira (PSB), a adutora é a única esperança. “Caetité cresceu e os mananciais já não estavam mais com a quantidade de água de antes. Com a seca, tudo piorou. Se não fosse a adutora de São Francisco, a gente já teria que ter abandonado Caetité, não teria outra maneira”, diz, referindo-se à primeira parte da obra da Adutora do Algodão, que garante pelo menos os tais quatro dias de água até que a obra seja concluída.
Clima
A crise de água em Caetité é ainda pior por conta da sua localização geográfica. O município fica no fim da Bacia do Contas. “Nós não temos muitos rios próximos, mesmo fazendo parte da bacia, fica muito difícil de a água chegar lá”, explica o presidente do comitê da Bacia Hidrográfica de Contas, Aurelino Lima.
Além disso, as chuvas são escassas na região, explica o coordenador de monitoramento do Inema, Eduardo Topázio. “Agora que o Inema está fazendo monitoramento de seca, aquela região nos últimos meses tem mostrando uma seca de fato. Chuvas em torno de 600 mm anualmente, que é um terço da pior média de chuvas de Salvador”, compara Topázio.
Por conta disso, a cidade tem sobrevivido por poços artesianos perfurados pela Embasa. Mas, ainda assim, em alguns casos, a água não serve para o consumo, por ser salinizada. “Ali são rochas. Aí a água fica nas fissuras das rochas, dissolve com a rocha e fica salinizada”, detalha Topázio.
O início da obra da Adutora do Algodão já permitiu que uma parte da água do Rio São Francisco, que passa a 150 km da cidade, chegue para auxiliar no abastecimento. As águas do rio já chegaram também a Guanambi, distante 40 km, que por alguns meses serviu de base para que caminhões-pipas levassem água até Caetité. Enquanto as ações forem paliativas, o “banho só aos domingos” é piada sem graça em Caetité. (Correio da Bahia)
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