ENSAIOS E ENTRETENIMENTO
Luís Miranda conta como compôs Dorothy, personagem transgênero que interpreta em Geração Brasil
“Olha, já estou até chamando a Dorothy de ‘ela’”. É assim que Luís Miranda, 44 anos, dimensiona o quanto é real a feminilidade de sua personagem em Geração Brasil, a trama das 19h da Globo.
Mas a mãe de Brian (Lázaro Ramos), que nasceu Dorival, é transgênero, ele explica: “Ela foi para a Califórnia se sentindo uma dama e lá conseguiu moldar o corpo: fez implante de prótese de silicone, virou mulher de cima a baixo”.
Foi depois disso que Dorothy conheceu o Bill (nascido Wilhemina, uma mulher que vivia como homem). Juntos os dois decidiram ter um filho, o que faz de Dorothy o pai biológico de Brian. E Bill, já morto, a mãe.
“Quando eles se conheceram, resolveram ter um filho e fizeram uma espécie de sociedade”, resume. O tipo físico de Luís, que tem 66 quilos distribuídos em 1,78, sem musculatura excessiva, contribui para dar tamanha veracidade à Dorothy. Mas, além disso, o ator fez “um trabalho de composição muito específico, observando o universo feminino”.
“Ela é a melhor amiga de Pamela Parker (Cláudia Abreu), uma mulher da alta sociedade. Então, busquei me inspirar em mulheres de representação forte, poderosas, como Michelle Obama e Fernanda Montenegro. Ao mesmo tempo, quis dar a ela uma delicadeza, uma sutileza e uma fragilidade”, conta.
Transformação
Segundo o ator, no momento em que ele põe a maquiagem, o figurino e a peruca, “Dorothy está pronta para o que der e vier”. Falando assim parece fácil, mas a transformação de Luís em Dorothy nos camarins do Projac leva em média uma hora e meia por dia. “Tenho que pintar as unhas, que deixei crescer para a personagem, diariamente. A maquiagem é o mais demorado, dura uns 50 minutos. Depois, tem a colagem da peruca, que já faz parte de mim. E aí ponho um enchimento lateral para ganhar quadris, a meia-calça, um sutiã para segurar o enchimento do peito, e o figurino”, lista.
O problema maior, ele conta, é ter que fazer a barba todos os dias. E ainda tem aquele outro que nós, mulheres, conhecemos muito bem… “O salto, porque aperta. Os sapatos mais delicados são aqueles de bico fino, e eu tenho pé de homem, com joanete (ele calça 41, os sapatos são feitos sob medida)”, justifica Luís.
“As gravações das cenas mais longas podem durar quatro horas e são quatro horas em cima do salto. A dificuldade para mim é que, para andar com elegância, é preciso jogar o peso para frente, não dá para descansar. Manter a postura da Dorothy é um exercício diário, mas hoje ela existe independentemente de mim”.
Tanto empenho é reconhecido nas ruas. Luís, que tem uma aplaudida carreira no teatro e no cinema, conta que, quando o vê ‘à paisana’, o público identifica o intérprete de Dorothy e festeja o trabalho. Ele já tinha experimentado tal sucesso televisivo quando viveu o cozinheiro Moreno no humorístico dominical Sob Nova Direção (2004-2007), mas diz que a mãe de Brian é seu personagem mais popular.
Frisson
“Até pela novela ter uma inserção quase diária, ser mais massificada. Em Salvador (cidade onde o baiano de Santo Antônio de Jesus mora), por exemplo, está o maior frisson, ouço muitos elogios. E as pessoas me perguntam por que botaram um homem para dar vida a uma mulher”.
Autor de Geração Brasil ao lado de Izabel de Oliveira, Filipe Miguez responde: “Tínhamos vontade de mostrar que um transgênero pode estar inserido na sociedade de maneira harmônica. Mas a gente criou a Dorothy mesmo para aproveitar a habilidade do Luís para interpretar personagens femininos. Vimos isso na Sheila, perua que ele interpreta.
Os autores também aproveitaram outra habilidade do ator. Em cena recente da novela, para salvar o filho, Brian, das garras do golpista Cidão (André Gonçalves) e seus capangas, Dorothy acionou o Dorival e desfilou golpes de capoeira. Luís, que é bailarino e versado na arte marcial, gravou quase todas as sequências: “Gravamos por duas horas e só precisei de dublê em uma cena mais arriscada”.
Cidão, a propósito, acabou se encantando por Dorothy, assim como Moreira (Claudio Mendes), diretor da Parker TV, que até já a convidou para um drinque. O ator acredita que ela vai se deixar envolver pelos dois…
“A Dorothy é uma mulher solteira, bonita, desimpedida, fogosa, ela vai se permitir. Mas ela é esperta, não vai se deixar enganar. Até porque ela não sabe se o interesse é real ou pelo fato de ela ser uma das acionistas da Marra Brasil”, pondera Luís, que quer morar nos Estados Unidos uma temporada para aprender inglês. (Correio da Bahia)
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